Sempre que um sistema tático impõe sucesso, ele acaba sendo reutilizado por outras equipes da mesma liga, e até em outros países. Após obter sucesso com a Juventus e a seleção italiana com o 3-5-2, o técnico italiano Antonio Conte implementou com igual sucesso o 3-4-3 no Chelsea na última temporada, e levou os Blues ao título da Premier League 2016/17. Consequentemente, várias outras equipes na própria liga inglesa, e em outros países, também passaram a utilizar o mesmo modelo, com variações importantes. Em alguns casos foi obtido sucesso, em outros, nem tanto.
Antonio Conte adotou o 3-4-3 no Chelsea em setembro de 2016, após derrotas para Liverpool e Arsenal. Antes, era raro algum treinador usar este meio na Inglaterra. Walter Mazzari tentou repetir o modelo de sucesso em seu Napoli no Watford, mas acabou não obtendo sucesso. Contudo, outros técnicos italianos voltaram a tentar esta formação, mas somente Conte, após dominar a Serie A com ela, tinha respaldo para aplicar ela de fato na EPL. Na atual temporada, Tottenham, Swansea, Everton, Manchester City, Arsenal, Stoke City, West Ham, Bournemouth e o próprio Chelsea, jogam (ou ao menos já jogaram) com algumas variações, mas se baseiam entre o 3-4-3/3-4-2-1/3-5-2/5-4-1/5-3-2, com zagueiros e alas. Destes, o City é quem mais muda para uma linha de quatro atrás, embora o Swansea também o faça. Outros clubes, como o próprio Watford, e especialmente o Manchester United de Mourinho já tentaram recentemente esta versão, e podem voltar a utilizar em qualquer momento.
Sistemas táticos com três zagueiros, não são de fato uma inovação. Se já existiam sistemas com três defensores em décadas passadas, antes do surgimento do 4-2-4 e dos modelos mais elaborados, foram nos anos de 1980 que começaram a se espalhar pelo mundo a ideia do uso de um terceiro zagueiro, após o uso com sucesso do líbero no futebol italiano. Um defensor extra erra escalado para fazer marcações individuais e/ou a sobra. Liberando os alas/laterais para o ataque. Aos poucos, outros países, e inclusive seleções nacionais foram incorporando o uso deste elemento. Argentina, Alemanha e Brasil alcançaram até títulos mundiais com a tática, que foi de fato vencedora.
Aos poucos o 3-5-2 foi caindo em desuso fora da Itália, mas após a ida de Guardiola ao Bayern, e especialmente a Copa de 2014, onde seleções como Holanda, Argentina, México e Costa Rica fizeram uso de cinco linhas ao marcar, com três defensores mais recuados, a pratica voltou a ganhar força. Assim como o 4-3-3 perdeu popularidade e depois voltou com força total, mas com variações para o 4-1-4-1, o 3-5-2 também varia bastante para o 5-3-2, de acordo com o recuo de alas/pontas. Mas, na Inglaterra, o 4-4-2, ou variação 4-2-3-1, eram e sempre foram quase as únicas opções de sucesso, até o desembarque de Conte.
O 3-4-3 de Conte no Chelsea, por várias vezes é um 3-4-2-1, já que Hazard e William são os extremos do campo, e atuam com tendências de mediapunta, por trás do centroavante. Assim, os alas Marcos Alonso e Moses fazem o lado do campo, ficando com a função da amplitude e da profundidade. Quando Pedro atua, ele pode abrir mais, fechando na diagonal, e dando uma importante variação. O 3-5-2/5-3-2, com Fábregas partindo da posição de armador, mas recuando por trás de Kanté e Bakayoko (ou outro mediocentro que atuar por ali), também é uma variação importante.
Estudioso, o argentino Mauricio Pochettino, treinador do Tottenham, foi o primeiro a testar os três zagueiros pós-Conte. Pochettino atuou com jogador na grande Argentina de Bielsa na Copa do Mundo de 2002, e sabe bem como se joga com três defensores centrais. No seu caso, o Tottenham muitas vezes atua com três zagueiros de fato, mas por vezes, muda de acordo como joga Dier, variando de acordo com a pressão e o setor da bola. Na hora de pressionar para retomar e transitar, ele pode pode se alinhar aos zagueiros e sair para gerar superioridade na pressão, mas posicional, ele volta, e o time joga em 4-3-2-1, com Kane apenas ficando mais na frente. Neste sentido, a chegada do marfinense Aurier para a ala direita foi muito boa, por se tratar de um jogador físico, mas com poderio para atuar na linha defensiva também. Ele irá variar com Trippier, jogador um pouco diferente, mas que pode fechar como terceiro zagueiro pelo setor direito - o que lhe dá um diferencial extra. O time pode variar do 3-4-2-1 para o 3-6-1, 4-3-2-1 e 4-3-2-1 em um mesmo jogo, sem mudar a sua escalação de fato.
Com vários problemas no Arsenal, Arsene Wenger também seguiu a tendência e passou a alinhar como base com três zagueiros centrais. Contudo, apesar de manter a mesma base de 3-4-2-1 do Chelsea, muda um pouco. Se Conte posiciona Azpilicueta como zagueiro, Wenger usa outro lateral espanhol como zagueiro: Monreal. Ele é o defensor que mais sai do lugar, com Mustafi jogando na sobra. Contudo, os laterais do Chelsea não baixam tanto junto à linha de zagueiros como os de Chelsea e Tottenham, com Bellerín e Kolasinac ficando mais ao lado dos interiores Xhaka e Ramsey. Os quatro carregam muito a bola nas transições, mas por vezes também avançam em posicional, o que deixa o time meio exposto, e talvez explique alguns insucessos.
Esquematização do Chelsea 0x0 Arsenal de 17 de Setembro de 2017. |
Pep Guardiola já havia usado sistemas com três zagueiros no Bayern, e em menor escala, no Barcelona. No City 2017/18, ele voltou a usar esta arma. Ao comprar Mendy, um ala agudo e incisivo, mais Danilo e Walker, jogadores que podem fazer tanto jogadas mais verticais, quanto associativas, Guardiola ganhou na possibilidade ter jogadores pelos lados agudos e capazes de dar profundidade e amplitude na frente. Assim, Ele pode atuar com três zagueiros e três meias, mais dois atacantes apenas, aproveitando o talento de Gabriel Jesus e Aguero pelo meio do ataque. Com Aguero se movendo e abrindo espaços, Jesus tem o cenário ideal para os atacar em velocidade. Otamendi, em qualquer circunstância, se soma ao meio como apoio, e por isto mesmo, Danilo atuou como terceiro zagueiro quando este sistema foi utilizado, mostrando a importância de ter um lateral de ofício para os balanços na hora das transições e movimentações em posicional.
Muito pressionado no Everton, Ronald Koeman tem tentado utilizar sistemas com três zagueiros, mas não conta com o mesmo sucesso dos casos supracitados, como tem ocorrido com qualquer modelo, mostrando que as causas de seu fracasso vão além da formação. Sem Lukaku, o Everton perdeu muita da capacidade de se colocar em campo rival, já que o belga "filtrava" várias jogadas quebradas com o seu jogo de costas. O pacotão contratado pelos Toffoes na janela ainda não deu o esperado resultado, sobretudo por conta de Klassen e Sigurdsson ainda não terem jogado simultaneamente com vários minutos em campo, e pelo fato de o Everton ter encarado quatro times do Big-6 da EPL nas cinco primeiras rodadas. Além do mais, o Everton ainda é pouco montado para o drible, a profundidade, a marcação pressionada e a luta pela segunda bola, características fundamentais em uma Premier League onde retomar a posse o mais rápido possível para impedir o rival de criar, e buscar a velocidade nas ações ofensivas são a marca da maioria das equipes.
O Crystal Palace de Frank de Boer também tentou o sistema com três defensores, mas formado erroneamente para o contexto da Premier League em vários momentos, também fracassou, e viu seu comandante ser demitido. Já o Swansea, do técnico Paul Clement, tem variado do 5-3-2 em fase ofensiva, com um zagueiro extra recuando para evitar espaços atrás na hora da transição defensiva, mas se defendo em um 4-3-3 onde um dos pontas não participa intensamente, caracterizando duas linhas de quatro. Por último, após um começo ruim, o West Ham de Bilic também tem se apoiado em um 3-4-1, embora a linha de quatro fique bem baixa, na relação aos demais citados. Zabaleta e Creswell são os alas, e Chicharito e Antonio tem atuado por trás de Carrol, que é a referência no ataque.
Ninguém sabe ao certo por quanto tempo a febre dos três zagueiros irá durar. Mas, além de Itália e Inglaterra, equipes da Alemanha, como Hoffenheim e Schalke 04, também vem utilizando linhas de retaguarda com cinco defensores. O futebol está em constante evolução tática, e o intercâmbio durante a Copa do Mundo de 2018 poderá trazer novos elementos, que redefinam sistemas, variando ainda mais este esporte, que por isto e várias outras questões, é o mais popular do planeta.
Imagem: Premier League