O técnico espanhol Pep Guardiola, já expôs que para ele, os sistemas táticos são apenas números, como linhas de telefone, que sem ideias, são apenas numerações. De fato, o termo sistema tático não é o mais adequado para essas numerações, pois o sistema tático é algo bem mais complexo, se referindo à dinâmica de funcionamento de uma equipe em campo. Assim, as numerações poderiam ser chamadas de esquema tático, ou até melhor, de linha tática, ou plataforma tática.
Entender um esquema tático é complicado, até porque a linha numérica pode incluir o goleiro, e separar meio-campistas, por exemplo. Assim, o 4-3-3 poder ser lido como um 4-1-4-1, de acordo com o recuo de extremos, ou mesmo 1-4-1-4-1. Geralmente, o esquema tático só é identificável em equipes que atuam de maneira mais posicional, e pode variar entre as fases de ataque e defesa, de acordo com, justamente, o funcionamento, a movimentação do time em campo. Por vezes, em equipes mais móveis, o esquema tático não é facilmente identificável, para confundir o rival mesmo.
O futebol vem do Rúgbi, e surgiu com um sistema similar ao tradicional da bola oval, o 2-8, ainda no século XIX. Futuramente, passou a se ler esse sistema como um 2-3-5, até que nos anos de 1920/30, o Arsenal de Herbert Chapman popularizou o WM, mas desde os tempos de Northampton, o comandante já implementada o jogo de associação, que formava uma figura geométrica em fase posicional de ataque. O WM era uma espécie de 3-2-5 em fase ofensiva, mas numa época de relatos de marcação individual, não haviam de fato linhas de marcação. A defesa mais posicional, em linhas, foi mais popularizada de fato com a marcação por zona.
Já ali, jogadores trocavam posições, mas as trocas eram mais horizontais, do que verticais. Rinus Michels, no “carrossel holandês”, arrumava a sua equipe em um 1-3-3-3, variação do 4-3-3, que tinha um zagueiro avançando como líbero. Os jogadores também trocavam de posição verticalmente, e como Cruyff, que era o "Falso 9", baixava na base da jogada, havia um vazio no centro de ataque, que era ocupado, por alguém que infiltrava do meio, ou um dos extremos. Com o extremo centralizando, o lateral podia avançar, ou Cruyff podia cair pela ponta. Haviam três jogadores pela esquerda, Krol, Henegen e Rensenbrink, três na direita, e três no centro, Suurbier, Jansen e Rep. Cruyff era o homem com liberdade. Ou seja, o sistema era simétrico, com um espaço e um homem livre, e a partir dali, havia as mudanças de posicionamento.
As táticas italianas
Ainda nos anos de 1930, o futebol italiano sofreu forte influência da Áustria, similar ao que ocorreu com Brasil e Argentina com a Hungria. Nos anos de 1930, a Itália foi bicampeã Mundial, sob o comando do técnico Vittorio Pozzo. Na época do WM, ele fez mudanças em seu jogo. Trocou o 3-2-5, pelo 2-3-5, formando o chamado MM. A intenção era dar maior liberdade para os seus jogadores, como Meazza e Piola. Segundo ele, o povo latino era diferente dos anglo-saxônicos, e seu futebol também o deveria ser. Jogando desta forma, a Itália foi bicampeã mundial, e campeão olímpica em Berlim-1936. A Juventus, foi campeã nacional entre 1931 e 1935. Este sistema foi passando por mudanças, ajudando a formar, por exemplo, o Catenaccio de Helenio Herrera nos anos de 1950. Mas na prática, todos os sistemas são variações do WM e do MM.
Na Copa do Mundo de 1982, a Itália se sagrou campeã com um sistema muito seu, e já questionado dentro do próprio contexto do Calcio. A equipe tinha três zagueiros, um deles sendo o líbero, um ala lateral, outro ala ponta, três volantes/meias, e dois atacantes. Os sistemas com três atacantes perdiam força, e a ocupação de espaços evoluía. A Alemanha, com o recuo de um volante, passaria a jogar muito no 5-3-2, com a figura de um meia central e dois atacantes. Era o sistema 2-3-5 usado em fase ofensiva, ao contrário, mas em fase defensiva, num movimento que ficou conhecido com a inversão da pirâmide. A Dinamarca, apelidada de Dinamáquina, também ficou famosa pelo seu sistema com três zagueiros, mas foi a Argentina de Carlos Bilardo, campeã no México, quem realmente marcou por esta tática.
Num futebol sem pontas, laterais podiam ser adaptados. Bastavam três zagueiros para defender bem a área, com dois encaixando nos atacantes rivais e um sobrando. A Argentina de Bilardo atuava com cinco meias, mais Maradona e Valdano se revezando na frente, entre desmarques de apoio e ruptura. A Argentina povoava o meio, e por lá dominava, ganhava. Em 1990, jogaria mais em um 5-3-2 mesmo, com uma defesa mais estática, mas já havia deixado sua marca.
Esse esquema com três zagueiros dominou as Copas de 1986, 1990, e até 1994, onde não foi usado por Brasil e Itália, os finalistas, que optavam pelo 4-4-2. O técnico da Itália era o lendário Arrigo Sacchi, que no Milan, havia obtido muito sucesso, com táticas como o pressing e linhas altas, fazendo até com que regras fossem alteradas, como a do recuo ao goleiro, que agora só poderia ser recebido com os pés, e a do impedimento, que já não era mais caracterizado quando o atacante estava na mesma linha do penúltimo defensor.
A Hungria de 1954, e a influência dela no que veio depois
A International Board foi evoluindo as regras do futebol e as táticas eram obrigadas a ir mudando. Num mundo ainda não tão globalizado, as Copas do Mundo eram quando os olhos do planeta se voltavam para o mesmo lugar. E ali, as evoluções ficavam marcadas.
O primeiro caso claro disto, se deu na Copa de 1954. A Hungria, com a base do Honved, time de um clube que encantava o planeta com seu futebol, aproveitou estes fatores para ser ainda mais forte. Na prática, a Hungria pegou o tradicional WM, e o transformou em um WW. O técnico Gusztav Sebes recuou o centroavante Hidegkuti para buscar o jogo, jogando com dois volantes, dois meias e três atacantes, mas um deles era quase um falso 9. Os outros dois, Puskás e Kocsis eram quase ponteiros, mas também com chegada na área para conclusão. Sem a bola, a Hungria introduziu ainda uma novidade: o recuo de um dos volantes para o sistema defensivo, formando uma linha de quatro defensores. Surgia assim o 4-2-4, que daria origem ao ao 4-4-2, estes com suas variantes e camadas. Era uma variação, uma mescla, do WM com o MM, formando um tipo de MW. Sebes também mandava seus jogadores mudarem muito de posição, abrindo espaços, e dando início à uma nova era no esporte.
O Futebol húngaro em muito influenciou o futebol sul-americano, em especial o brasileiro e o argentino. Nos anos de 1940, a "La Máquina", do River Plate, atacava em 2-3-5, mas se defendia já em 4-3-3. Se dizia que o sistema era só 2-3-5, pois o time muito mais atacava do que defendia. Em 1958, o quarto zagueiro já existia, e o 4-2-4, criado aqui no Brasil, era uma realidade. No Brasil de 1958, campeão do Mundo, o ponta-esquerda Zagallo, recuava para o meio, virando uma espécie de interior, e variando o esquema para o 4-3-3. Se em 1958 Zagallo foi um ponta de recuo, em 1962 ele foi um interior mesmo, deixando a ponta, por vezes, para Amarildo. O recuo de Zagallo ajudou a reforçar movimentações na Europa. Passaram-se a recuar os dois pontas para o meio, formando um losango, ou uma segunda linha de quatro.
Se o losango e a marcação por zona ficaram como filhas do Soviético Viktor Mazlov, que passou a os empregar após a Copa do Mundo de 1958, o 4-4-2 passou a ser muito utilizado na Inglaterra, com um jogo intenso, direto, e de busca pela segunda bola. Se o Brasil foi campeão em 1970, com um dito 4-2-4, que era na verdade um 4-2-3-1, com Pelé como ponta-de-lança, desfilando como um verdadeiro Deus do futebol, as evoluções seguiriam. Aquela Seleção brasileira de Zagallo não tinha centroavante fixo, e nem ponteiros dando amplitude. Os laterais Carlos Alberto e Everaldo (este mais na base da jogada) é que davam largura ao campo, e Gerson e Clodoaldo eram os volantes/meias, enquanto Pelé hora era flecha, hora era arco, atuando por trás de Jairzinho, Tostão e Rivelino. Num futebol mais dividido e cadenciado, cabia ao rei ver as movimentações dos companheiros, e enxergar um buraco para passar a bola e se lançar. O futebol na prática é dos craques, e treinadores inovam para os potencializar. Este Brasil de 1970, mostrava bem isso.
Na prática, no começo, não haviam linhas de marcação, pois as defesas eram mais de perseguições e encaixes, e menos posicionais. Para haver linhas de marcação, há de se ter defesa posicional "estática". Assim, o 4-3-3, por exemplo, nada mais é do que uma variação defensiva do 2-3-5 ofensivo, e o 4-1-4-1 defensivo, é uma variação do 4-3-3. O 5-4-1, é uma variação do WM, com recuo dos alas, e o 4-4-2 é uma variação do 4-2-4, com recuo de extremos. As combinações vão se adaptando ao seu tempo, e treinadores vão se adaptando aos seus atletas. Assim, a evolução é temporal, não é futebol que progride, é o tempo. O futebol, se adapta ao seu tempo, aos contextos, e circunstâncias.
O jogo de Posição e o ataque posicional
No Jogo de Posição, a bola vai às posições, e não os jogadores vão até a bola. Ou seja, os jogadores atuam dentro de uma determinada localização em campo, e lá esperam a bola chegar. Os apoios existem, mas são entre posições. As bases do jogo de Posição estão no “Futebol Total” de Rinus Michels, e Johan Cruyff.
O futebol foi levado à Holanda pelos ingleses, e o próprio Ajax, maior clube do país, tem forte influência britânica. O inglês Jack Reynolds, comandou o clube entre 1915 e 1947, e era um seguidor da filosofia de Champanhe. Na sequência, Vic Buckingham assumiu o clube de Amsterdam, implantando um futebol possessivo, que era praticado desde as categorias de base. Mais tarde, em 1965, Rinus Michels assumiu o comando do Ajax, na mesma época em que o conceito do funcionamento orgânico tomava Amsterdam. A cidade era absolutamente planejada. Cada ponto dela era feito para o seu bom funcionamento, e dos outros. Estava ali a base do "Futebol Total". Os jogadores teriam em campo menos liberdade de ação, para que o coletivo funcionasse melhor.
Michels passou para Cruyff o conceito de futebol orgânico, e com ele o controle do espaço, a base do futebol total. O futebol não era ali vencido pelo controle das ações e do tempo. Eles eram as ferramentas para controlar o espaço, e a partir daí buscar o objetivo final, que é a vitória. Os movimentos em campo eram sistêmicos, o que levou à criação de um novo tipo de jogo, elaborado por Cruyff no Ajax, e evoluído posteriormente por seu desafeto Louis van Gaal, seu sucessor no clube. Foi elaborado o conceito do “terceiro homem”, a segunda linha de passe, o homem livre por trás da linha defensiva, da marcação rival. Cruyff passou a usar no Ajax o sistema 3-4–3, com um losango no meio. Assim como a Argentina de 1986, usava o sistema com três zagueiros para marcar dois atacantes, já que a maioria dos times no planeta jogava em 4-4-2/4-2-2-2 nesta época.
Posteriormente, Cruyff assumiu o comando do Barcelona, e por lá foi campeão europeu em 1992, usando um 3-4-3, onde fazia a busca pelo controle do espaço, e da progressão orgânica em campo, pensando em evoluir sempre em vantagem, e não com ações. Em 1995, Louis van Gaal foi campeão europeu com o Ajax, usando um Jogo de Posição extremamente rígido. Posteriormente, LvG assumiu o comando do Barcelona, e por lá conquistou alguns títulos nacionais, mas não conseguiu a Champions League. Ele entrou em atrito com craques, como Riquelme e Rivaldo, que era mediapuntas originais, mas não se mostravam dispostos a ficar presos na extrema, ou recuar para a função de mediocentro. Posteriormente, Frank Rijkaard e Pep Guardiola evoluíram os conceitos do Jogo de Posição no Barcelona. Se Rijkaard era um pouco mais rígido, Guardiola foi cada fez mais ficando flexível, e misturando conceitos do Jogo de Posição com elementos tradicionais de mestres como Arrigo Sacchi, Marcelo Bielsa, e Ricardo Lavolpe.
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